2008/07/06

Ela está com bom aspecto

ELA ESTÁ COM BOM ASPECTO


Ferreira Fernandes
jornalista
ferreira.fernandes@dn.pt
Está com bom aspecto, Ingrid Betancourt. Fico contente por a ver assim. Mas há também quem diga: "Está com bom aspecto, Ingrid Betancourt." Não é esta frase igual à minha? De regozijo? Não. É dita exactamente com sentido contrário, em forma de acusação: "Esta gaja, que ainda em Outubro do ano passado parecia uma tuberculosa olheirenta, aparece agora toda lampeira, de olhos brilhantes e até gorda, com duplo queixo…" Sim, há quem diga isso. E há quem responda: "Eh pá, também me dei conta! Isto é muito estranho…" São diálogos da blogosfera.

A blogosfera é o inferno para Jean-Jacques Rousseau: atirou a mentira deste ("os homens são naturalmente bons") definitivamente para o caixote do lixo da História. Pelas formas tradicionais de comunicação - conversas, jornais, moções parlamentares do PCP - os homens aprenderam a não dizer o indizível. Se têm de engolir um sapo - o fim da prisão de Ingrid Betancourt é um sapo para muita gente -, metem uns "mas" no discurso mas engolem-no. Ninguém diz: "Estou chateado com a libertação dessa agente do imperialismo." Só na blogosfera essa sinceridade insana acontece. Enfim, talvez Miguel Urbano Rodrigues seja capaz de dizer o mesmo, mas Miguel Urbano Rodrigues não é exactamente uma forma tradicional de comunicação. É mais uma forma do Paleozóico.

Já a blogosfera é moderníssima. Gosto dela porque nela muita gente escreve bem e também porque me garante: sim, os pulhas existem e até se exibem. A blogosfera acreditou para si uma tal forma de impunidade que chega a ser enternecedor ir lá para ver o que as pessoas dizem. Sobretudo nesse superlativo absoluto simples da blogosfera (onde já não se escreve tão bem mas a sinceridade é ainda mais crua) que são as caixas de comentários dos blogues. Como o anonimato é quase a regra, as pessoas expõem-se até ao mais recôndito bocado de si, sendo este, a mais das vezes, o intestino grosso.

É aí que tenho encontrado "Luísa", em várias caixas de comentários, geralmente a defender a Cuba de Castro e os narcotraficantes das colombianas FARC. Foi ela quem me alertou, agora, para a célebre fotografia de Ingrid Betancourt, de Outubro de 2007, magríssima e olhos desalentados, e a comparou com a esfuziante mulher destes dias. Desde Outubro, sabe-se, houve várias possibilidades de entrega da prisioneira e é natural que a engordassem para as FARC não ficarem muito mal na fotografia (delas, as FARC). Mas "Luísa" prefere sugerir: a prisão de Ingrid Betancourt foi uma farsa e a prova é que ela aparece como quem vem de um spa.

Não vou insultar ninguém lembrando o que Ingrid Betancourt perdeu nestes seis anos - quem quer, sabe. E fico muito agradecido à blogosfera por me lembrar que há gente como "Luísa".|

Bom dia
Acabei de ler a edição em linha do DN e, como habitualmente, comecei pela secção Opinião onde leio os seus escritos sempre em primeiro lugar (já agora um obrigado sincero pelas crónicas sobre Euro).

Concordo consigo quanto quanto à blogoesfera e o constante uso da insinuação sibilina e torpe quando não mesmo da calúnia "tout cour" quase sempre sob a protecção do anonimato.

Infelizmente após completar a leitura do DN cheguei à conclusão que a blogoesfera não está sózinha.

Atentemos, então, no DN editado no mesmo dia (coincidencias...) onde escreveu a crónica que provocou esta mensagem.
Na secção Inernacional, em artigo titulado "Saúde de Ingrid resiste a seis anos de cativeiro" assinado pela jornalista Susana Salvador escreve-se, "... A última imagem que havia de Ingrid Betancourt, a franco-colombiana que esteve mais de seis anos sequestrada pelas Forças Armadas Revolucionárias da Colômbia (FARC), era a de uma mulher magra, abatida, tirada de um vídeo filmado em Novembro. Por isso foi com algum espanto que o mundo a viu descer, confiante, do avião no dia da sua libertação. Ontem, depois de a ex-candidata presidencial ter passado sete horas num hospital militar em França a fazer exames, a irmã confirmou que os resultados médicos são "satisfatórios"." (sublinhado meu).

Não conheço a sua "amiga" Luísa (nem me apetece) mas afinal não foi só ela que ficou espantada. Citando o referido artigo parece que o "mundo" também ficou.

Melhores cumprimentos

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