2008/01/22

A questão do Kosovo

Partilho da opinião dos que defendem a inutilidade destas "Windependencias" idiotas e fúteis.
Para não deixar estas questões no esquecimento aqui vai um post e comentários do Abrupto.
A revisitar um dia destes.

LENDO
VENDO
OUVINDO
ÁTOMOS E BITS
de 21 de Janeiro de 2008

O Público tem hoje um título bizarro numa notícia sobre as eleições na Sérvia: "Sérvios do Kosovo votam contra Ocidente". Presumo que queriam dizer "contra a UE", porque contra o "Ocidente" só ignorando a história dos sérvios, e muito mais dos sérvios do Kosovo. Os sérvios do Kosovo consideram-se a última fronteira face ao Islão, o último baluarte do cristianismo e da "civilização" face à "barbárie" turca, representada hoje pelos albaneses. Consideram que foram eles a fronteira da Europa cristã e que pagaram um preço muito cruel por essa guarda avançada. Não lhes passa pela cabeça fazerem parte de um protectorado albanês, um país que pertence à Liga Islâmica. É verdade que consideram que a UE os abandonou, a própria UE que tão protectora é de outras minorias, e olham para Moscovo. Mas Moscovo para eles não é apenas um contra-poder dos EUA e da UE na Europa, é também a Santa Rússia, a mãe da ortodoxia, a Terceira Roma, protectora dos sérvios e dos búlgaros na luta contra os otomanos. A História ali conta demais, é por isso que dizer que votam contra o "Ocidente" não tem pés nem cabeça aplicado aos sérvios. Os sérvios são o "Ocidente".


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Partilho da sua crítica ao título artigo do "Público" onde se diz que "Sérvios do Kosovo votam contra Ocidente". Infelizmente a questão do Kosovo e os problemas dos Balcãs em geral têm sido muito mal analisados pela nossa imprensa que, salvo algumas excepções honrosas, está notoriamente pouco preparada para retratar e analisar a complexidade desses conflitos. Mas o problema mais grave até nem é o da imprensa, mas o da classe política europeia e portuguesa, que parece ter, na melhor das hipóteses, algumas vagas ideias generalistas sobre o assunto. No meio da actual deriva europeia sobre a questão da independência do Kosovo, o artigo assinado pelo eurodeputado Mário David no "Expresso" desta semana, ("A armadilha do Kosovo e o Futuro da Europa") é uma invulgar voz de bom senso. O autor alerta para aquele que poderá ser "um gravíssimo precedente no âmbito do Direito Internacional" e para as consequências da actual política míope da União Europeia. Se a declaração de independência (unilateral) do Kosovo for reconhecida, interroga-se este, "que legitimidade haverá para obstaculizar que a República Serbsca não queira continuar na Bósnia Herzegovina? E a questão da Voivodina? Da Transnistria? ou da Transssilvânia? ou da Ossétia ou da Abcásia? Ou da Tchetchénia ou outras dezenas de repúblicas da zona que nunca ouvimos até agora falar? São nomes que não nos dizem quase nada? E quando o precedente for invocado pela Córsega, pela Flandres, pelo País Basco ou pela Catalunha? Aí já não vale?". Infelizmente tudo indica que esta União, que há vários anos está em dupla fuga para a frente - faz tratados e alargamentos alimentando uma ilusão de "Europa em movimento" -, vai optar pelo mais fácil: o reconhecimento da independência do Kosovo. Todavia, as consequências desta decisão aparecerão certamente mais à frente. Como este lembra, as futuras gerações europeias arriscam-se a ter de pagar a factura deste perigoso e irresponsável precedente, que abre caminho a "uma Europa atomizada de dezenas de regiões em permanente querela para a afirmação obsessiva das suas mini-identidades"! Quo vadis Europa?

(José Pedro Teixeira Fernandes)

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O seu texto evocou-me um debate público sobre as embrulhadas balcânicas, vai para uma década, e onde uma intervenção que fiz sobre as motivações sérvias, próxima da sua argumentação, suscitou alguma desconfiança: arriar em Milosevic era mais digerível e descansativo... Se não considerarmos as heranças históricas e a forma como elas nos conferem um estatuto e nos posicionam no mundo, sempre nos irá escapar a razão maior para tantas reacções e alergias que pontuam o nosso contemporâneo; ganha a questão maior acuidade quando está em causa uma superfície de fricção entre duas civilizações. As leituras destes confrontos que se limitam ao campo do político acabam frequentemente por omitir o essencial: a forma como as sociedades se imaginam e se percepcionam, e como imaginam e percepcionam quem as avizinha... E isto será válido para os sérvios no Kosovo - mas também, e para me ficar por um só exemplo, para compreender a visceral aversão de húngaros ou polacos ao domínio russo-soviético.

(AERM)

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